Entregue ao princípio de prazer, Herculano não age mais dentro de ações pautadas em sua
sobrevivência como aquele que é o chefe da família. Sua postura conservadora vai se corroendo
cada vez mais ao se envolver com Geni. No entanto, ao ser arrastado pelo princípio de prazer
por meio da figura da prostituta Geni, Herculano mantém o seu poder frente à família. É ele
quem articula, mesmo que de forma ingênua, como inserir Geni no seio de sua família. Embora
orientada pelo irmão de Herculano, Geni quer de fato se casar com aquele homem, representante
do conservadorismo burguês carioca. No final, ela busca o reconhecimento social, tentando
superar assim a sua condição de prostituta. No entanto, ao longo da narrativa fílmica, Geni vai
sendo envolvida pela família, principalmente por Serginho, filho de Herculano, que se torna
seu amante.
Se a fragilidade de Herculano está no seu assumir o princípio de prazer, a de Geni está em seu
próprio romantismo de querer ser aceita socialmente como mulher casada e respeitável, dentro
dos padrões socioculturais de uma família conservadora e burguesa. Ela não consegue perceber
que desde o início do romance com Herculano foi usada numa espécie de joguete, seja nas mãos
do irmão manipulador, do futuro marido, bem como do enteado Serginho. A condição social
de Geni não lhe permite nenhum tipo de ação que lhe possibilite elaborar formas de contrapoder
em relação ao masculino. Ao contrário, Geni é castigada, não conseguindo qualquer tipo de
redenção.
A única forma de contrapoder que Geni pode realizar é o seu suicídio. No entanto, tal suicídio
não é o suficiente para se contrapor ao poder masculino. Ao cortar seus próprios seios, ela se
sacrifica em vão; pois Geni contribuiu para a vingança tanto do irmão como de Serginho em
relação ao chefe da família, Herculano. Este, por sua vez, após ter a experiência do princípio de
prazer, está aberto para novos prazeres. Herculano sabe que pode sentir a dor pela perda da
segunda esposa, porém compreende também que no final das contas é o seu prazer que está em
jogo. Geni como expressão da liberdade libidinal tem que ser expurgada, pois seus desejos
significa a própria destruição da racionalidade civilizadora fundada naquilo que é útil, ou seja,
utilitário para a manutenção da vida em sua dinâmica social.
É a partir da análise e interpretação desses dois clássicos da cinematografia latino-americana
que podemos apreender elementos da linguagem artística para elaborar formas
interdisciplinares em relação ao universo educacional. Não se trata de criar novos conteúdos
disciplinares para uma suposta grade curricular, principalmente nas últimas séries do ensino
médio. Porém, do que se trata é de possibilitar o educador fazer relações entre a linguagem
artística, no caso presente cinematográfica, e a sua disciplina, que a princípio está situada nas
áreas de humanidades, porém, não necessariamente.
Como vimos, os filmes tratados no presente artigo estão vinculados à problemática do
reconhecimento das identidades femininas no âmbito psíquico, social, político e histórico. É
importante, que antes de tudo, por assim dizer, o educador (não importa como ele compreende
sua própria identidade de gênero) procure aumentar o seu acervo cultural. Daí, a necessidade
de investigar ou procurar filmes como A Falecida ou Toda Nudez será Castigada para pensar
quais as questões humanas podem ser tratadas, didaticamente, em atividades educacionais.